Raquel Carpenedo

O Mistério da Rosa Branca

Distraída, não havia percebido Miríade entrar no quarto. Miríade era minha irmã mais velha.  Tínhamos uma diferença de dois anos e meio. Ela era tão silenciosa que por inúmeras vezes pensei ser ela um anjo na forma humana.

Entrara tão silenciosa e sorridente que, embora eu estivesse cansada e pensativa, fez-me sorrir ao vê-la. Trazia nas mãos outra rosa branca para mim e num comentário um tanto irônico, fez-me ficar envergonhada e ao mesmo tempo furiosa.

– Esse cara deve ser apaixonadíssimo por você, irmãzinha, pois é a sexta rosa branca que recebe em três semanas.

Realmente era a sexta rosa branca que eu recebia. E a cada rosa que chegava, uma sensação esquisita tomava conta de mim. Era uma mistura de alegria temperada com medo e angústia. Nenhum cartão, bilhete, nada que identificasse a pessoa que estava enviando essas flores encantadoras. Por mais que pensasse, não lembrava de ninguém que, pelo menos nesses últimos meses, tivesse demonstrado interesse pela minha pessoa.

Eu não era aquele tipo de pessoa que despertaria paixões em alguém. Sempre fora um pouco tímida, caseira, daquelas pessoas que chegam em casa e querem sossego, um bom banho, uma boa leitura, um bom filme. Tinha poucos amigos em meio a tantos conhecidos. Realmente, não conseguia imaginar quem poderia estar enviando essas flores. Seria um aviso? Um pedido de ajuda? Ou, quem sabe, estariam chegando até mim por engano?

Miríade ainda estava no quarto, quando deixando de lado meus devaneios, perguntei a ela:

– Tem certeza de que não viu ninguém deixar a rosa, que não tinha nem um bilhete?

– N-A-D-A!!! – respondeu-me dando uma piscadinha maliciosa. – Apenas a rosa e seu nome em um pequeno pedaço de papel.

Miríade saiu e deixou-me pensativa. Por longos minutos contemplei a rosa branca com milhões de pontos de interrogação perpassando minha cabeça.

Nesse momento, um estampido seco tirou-me do devaneio. Demorei um pouco para perceber que fora um tiro e vinha da rua.

Corri para a sala no exato momento que Miríade entrava da sacada do apartamento com os olhos esbugalhados, como se tivesse visto algo terrível. Morávamos no segundo andar de um prédio localizado no centro da cidade. Ela estava branca de pavor, o que não era normal em minha irmã, pois eu a considerava uma pessoa equilibrada, sensata e prática.

Vendo seu estado, corri em sua direção e sacudi-lhe os ombros para que saísse daquela espécie de transe. Ao voltar a si, ela olhou para mim e espalmou as mãos em meu rosto pedindo que eu não me aproximasse da sacada. Seu pedido era quase um implorar. Sem entender o que se passava e por que ela queria me poupar de algo, desvencilhei- me de suas mãos e corri até a sacada. A multidão aglomerava-se em torno de um corpo estendido na rua, murmúrios podiam ser ouvidos, mas não entendidos. As luzes da viatura policial e da ambulância pareciam enlouquecidas. Gritos de alguém desesperado enchiam o ar e deixavam a cena ainda mais grotesca e dolorida.

Nesse instante, um dos policiais afastou-se para o lado e eu pude ver na mão da pessoa ferida uma rosa branca. Meu sangue pareceu congelar e minha respiração por alguns instantes parou. Um suspiro acompanhou minhas palavras:

– Não pode ser verdade o que eu estou vendo!

Desesperada, corri para a porta e abrindo-a num ímpeto, desci as escadas de dois em dois degraus, com Miríade atrás de mim gritando:

– Espere por mim! Calma! Vai devagar!

Ao chegar diante do corpo ali atirado no asfalto, percebi que ainda respirava. Seus olhos encontraram os meus e como se tivesse esperando a minha presença, fitaram-me demoradamente e num único suspiro fecharam-se. Não sei se foi impressão, mas seus lábios moveram-se quase imperceptivelmente em um sorriso que outras pessoas não teriam percebido devido ao tumulto.

O policial virou-se para mim e perguntou secamente:

– Você o conhece?

Um tremor invadiu meu corpo e nervosamente respondi:

-Não. Não faço ideia de quem seja. Desci porque ouvi o tiro e a confusão diante do prédio.

Percebi que o policial me observava. Afastei-me, mas meu coração e meu pensamento estavam descontrolados, minhas mãos tremiam. As pessoas aos cochichos comentavam sobre a rosa branca na mão da vítima.

E agora, seria essa a pessoa que enviava para mim as rosas? Ou ela também havia recebido e isso era um sinal.

Um medo súbito invadiu meu peito e silenciosamente puxei Miríade pela mão e juntas entramos no prédio rumo ao nosso apartamento.

Ao vencer o segundo lance de escadas, uma surpresa aguardava-me bem em frente a porta.

Texto escrito por: Raquel Carpenedo

4 Comentários

  1. Elizabete da Cruz Pohl disse:

    Olá querida Raquel Carpenedo, fostes professora no colégio Dom Bosco no ano de 1988? Acredito que fui sua aluna.

    • Raquel Carpenedo disse:

      Olá, Elizabete! Creio que sim. Iniciei no Dom Bosco exatamente nesse ano. Saudades! Continuo lecionando, mas agora só na Escola Municipal.
      Abraços. Visite meu Blog sempre que quiser.

  2. Steffany disse:

    Meu pai amado! Necessito da continuação,adorei demais!

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Sobre Raquel Carpenedo!

Sou Raquel Carpenedo. Nasci em Santa Rosa, Rio Grande do Sul em 1966. Graduada em Letras , com pós-graduação em Leitura e Redação e pós-graduação em Educação Especial. Fui professora de escola particular por 25 anos. Atualmente, sou professora das séries finais do Ensino Fundamental da Rede Pública Municipal.

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